segunda-feira, 4 de junho de 2007

Teatro no Centro Cultural São Paulo desconstrói o público

A peça "Desconstruindo" de Cesar Ribeiro em cartaz no Centro Cultural São Paulo (rua Vergueiro, 1000, porão) aos domingos até o dia 8 de junho é um bom exemplo do teatro experimental que retrata o olhar da contemporaneidade. Com um quê de criatividade e boa idéia a "peça" interage com o público de maneira muito diferente e bastante experimental. Ela passa através de crônicas um retrato de nossa sociedade nos aspectos éticos, políticos e sexuais.

Ao entrar numa peça, um espectador pensa que vai sentar em sua cadeira e esperar o espetáculo começar, mas não é bem assim que acontece em "Desconstruindo". No início, em um porão escuro do centro cultural ouve-se uma voz dizendo que a "platéia" é livre para fazer o que quiser, comunicar-se com os atores, sair do porão, ou qualquer outra coisa; ou seja os presentes podem fazer o que quiserem. Os atores estão espalhados pelos contos do subsolo, contando contos cada um em um lugar diferente do porão, e cabe aos espectadores o trabalho, ou melhor à diversão de se dirigir a eles e deliciar-se com as histórias interpretadas.

Em um arranjo estético "desarranjado", as diversas histórias de autoria de Cesar Ribeiro vão dando espaço para as interpretações do público ouvinte. As crônicas se revezam entre o cara que é fissurado por bundas, um garçom gay que tenta fazer o máximo para conseguir um beijo de um outro homem mas não consegue, e um mundo animalesco que se torna humano. No início pode parecer confuso mas com o tempo os espectadores se acostumam com a forma do espetáculo. Ao todo cerca de 8 atores trabalham contando histórias repetidamente sem cessar um minuto mesmo que em frente de sua arquibancada improvisada não haja ninguém, eles usam maquiagens muito brancas e vestem os mais variados tipos de roupas, que são em sua maioria o personagem de que estão contando as histórias. Uma das mais envolventes é provavelmente a de um homem casado que está enjoado do casamento e corre atrás de novas "bundas" para serem apreciadas e comidas.

Não obstante, outro grande contador de histórias e ator que se revela é ator mestiço Thiago Mine Vieira, que se destaca pela sua grande estética corporal, sua crônica é de um homem que perdeu a perna. Ele é ator há 5 anos e se profissionalizou há 2. Esta é a primeira grande peça de atuação. " O texto (dessa peça) é meio surreal, então você não tem uma conexão de uma idéia com a outra, é difícil de você pegar, tem que criar um subtexto próprio. Apesar de ter uma narrativa clara, a história, o cara vai, perde a perna procura, no final das contas morre numa danceteria. Ele (Ribeiro) usou uma linguagem diferente, não só a história é surreal como o jeito que ele escreveu é surreal, então por isso foi difícil. Eu faço um texto de dois minutos em 1h15 e isso acaba virando uma espécie de mantra, ainda mais que eu tenho uma movimentação muito louca e você acaba ficando assim dopado. É maluco pra mim que tô fazendo, não sei pra quem tá olhando". Quanto ao espetáculo Mine disse que a idéia era mesmo fazer a "desconstrução": "O próprio texto é pretexto. O grande lance é o cara chegar aqui e ver um espetáculo de fato desconstruído, ele vê o que ele quer, da maneira que ele quer, se ele não entender acho que isso não interfere, porque eu acho que a gente acaba trabalhando numa camanda de entendimento que ela é meio sinestésica, então ele (o visitante) pode estar às vezes vendo um ator falar, estar ouvindo este ator tá falando e pode tá olhando para um outro, então as histórias vão se cruzar, e mesmo que ele esteja tentando assistir uma peça ele vai ser interferido por uma outra que tá sendo dita alí, então eu acho que na verdade essa experiência que ele tem é mais valiosa que o entendimento de cada texto individualmente. Se a pessoa puder entender melhor, ou não, mas enfim, ela vai ter a experiência X dela, se a outra pessoa não entender nada. Hoje tinham crianças aqui e elas vão ter a experiências dela. Como peça eu acho que essa é a proposta e nisso que eu tô dentro. A proposta é desconstruir e quem constrói é o público. "

Para a estudante Marília Xavier Assunção esta é a primeira peça que ela "assistiu" que tem uma outra forma."Onde os atores foram colocados eu achei muito legal, a luz do lugar, e a simplicidade que ficou bonita, ficou uma coisa que você se sente mais confortável." Ela diz que o teatro é muito formal e define o que achou com a palavra "desconstrução": " Eu achei que ficou bem legal a questão de você estar na frente mesmo do ator, cara a cara, é uma coisa mais pessoal, você estar em conexão maior com o ator." As crônicas que Marília mais gostou foi a do rapaz do boteco, do rapaz da impotência sexual, e do garçom. A estudante também elogiou a maquiagem e as vestimentas dos atores.

Já para o ator Rafael Menta que assistiu à peça, disse que gosta muito do texto ousado de Ribeiro que é bem ousado e interessante. "É engraçado, é bom, o que eu mais gostei foi o das bundas, o personagem é engraçado é um humano, todas as idéias e teorias que ele tem sobre as bundas. E também do texto dos macacos que tem umas sacadas políticas engraçadas, umas alfinetadas políticas." Mas criticou com relação ao espaço. " O espaço não ajuda muito, é cheio de eco, e muito aberto, então acaba um texto influenciando no outro e os atores tem que se esforçar muito para falar mais alto, mas é bom, é interessante, é legal, diferente, te coloca numa coisa que não fica confortável, e ao mesmo tempo fica confortável porque você pode fazer o que quiser, fumar, atender o seu celular. O que eu não gostei foi que o espaço é muito aberto, foge muito o som, mas acho que era a proposta mesmo dele."

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